segunda-feira, 12 de outubro de 2009

Impacto do Dividendo Digital na TDT

É já sabido que após o chamado desligamento analógico, que em Portugal se prevê ocorra em Abril de 2012, uma larga faixa do espectro radioeléctrico será "libertado" ou "desocupado". A essa "libertação" de espectro dá-se o nome de Dividendo Digital.

Precisamente, uma das principais vantagens dos sistemas de difusão digital prende-se com a economia de espectro, ou seja, necessitam de ocupar um espaço (frequências) muito menor para difundir os programas. Com a substituição da difusão analógica pela digital (DVB-T, ATSC, etc), a maioria das frequências utilizadas para a difusão dos actuais canais de televisão ficará disponível.

A Comissão Europeia tenta implementar uma harmonização entre os estados membros relativamente a esta questão. Á semelhança de outros países, também em Portugal (através da ANACOM), se discutiu a utilização a dar ao espectro a libertar em 2012. Apesar de não divulgar publicamente o relatório da consulta pública que decorreu para o efeito, a ANACOM transmitiu num texto publicado as suas conclusões a propósito do mesmo.

Tal como se esperava, o que mereceu mais interesse (ou “apetite”) por parte dos interessados (presumivelmente operadores móveis), foi a atribuição da faixa de frequências 790-862Mhz para comunicações móveis de banda larga. Recorde-se que esta faixa é actualmente utilizada na difusão da TDT. Por motivos técnicos e económicos, os operadores de serviços móveis têm feito fortes pressões para lhes ser atribuída essa faixa de frequências a fim de expandirem as suas redes. Alguns países (Espanha é um deles), já decidiram nesse sentido. Em simultâneo, a ANACOM consultou a GSMA sobre esta matéria que, como é óbvio, defende a atribuição dessa faixa de frequências aos operadores móveis.

O seguinte parágrafo do texto da ANACOM merece alguma reflexão:

«Realça-se também que se perspectiva que mais países europeus venham a tomar decisão idêntica, reforçando cada vez mais uma harmonização de facto a nível europeu quanto a esta sub-faixa, pelo que se começa a desenhar uma tendência generalizada da sua atribuição para aplicações móveis de banda larga – agora também em Espanha – facto que deverá ser particularmente ponderado numa decisão final sobre esta matéria, nomeadamente quanto aos elevados riscos de isolamento que Portugal pode correr neste domínio

Quando foi seleccionada a norma MPEG-4 não terão sido ignorados os riscos de isolamento relativamente a Espanha, que adoptou o MPEG-2!?

Como é óbvio, esta decisão não é pacífica! A encabeçar o grupo dos “descontentes” estão os grupos operadores de televisão que argumentam que irão ter custos acrescidos, pois serão obrigados a mais um processo de transição. Em Portugal, como os operadores de televisão não têm rede própria (a difusão do sinal de televisão está a cargo da PT) esta questão não se deverá colocar. Não esqueçamos que a PT pretende antecipar o desligamento do sinal analógico em um ano, para 2011. Certamente que a PT irá concorrer (e provavelmente ganhar) o(s) concurso(s) que se avizinham. No entanto, a maioria dos telespectadores que recebam a TDT através de sistemas colectivos terão que realizar novas alterações nos sistemas de recepção! Os restantes espectadores apenas terão que re-sintonizar os seus receptores.

Para além da sub-faixa 790-862Mhz, que deverá ser destinada a comunicações móveis de banda larga, grande parte do espectro entre 470Mhz e 790Mhz ficará livre. Uma parte será destinada à televisão digital móvel e à alta definição. Infelizmente, relativamente à televisão regional e local mantém-se a indecisão. Nesta faixa (banda IV e V), para além das actuais frequências cujas licenças já foram atribuídas, a ANACOM planeou 3 coberturas MFN de âmbito nacional, 1 cobertura MFN de âmbito distrital e 3 coberturas MFN de âmbito nacional destinadas ao DVB-H.

Sendo o espectro radioeléctrico um bem público com o potencial de gerar enormes receitas para os detentores das licenças de exploração, esperemos que o Estado saiba obter as justas contrapartidas financeiras. Recorde-se que a optimização do espectro conseguida em parte devido à adopção da norma MPEG-4 (versus MPEG-2) tem, até à data, beneficiado apenas o operador da rede e os canais de televisão que pagam uma taxa de utilização mais baixa. O telespectador, esse foi “contemplado” com uma factura mais alta para pagar pois, como é sabido, os equipamentos compatíveis com a TDT portuguesa são (muito) mais caros.

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9 comentários:

Pathlost disse...

Excelente Post, do melhor que já vi neste blog. E acerta em cheio na grande, grande questão que a TDT encerra - o benefício do Dividendo Digital.
Este benefício está em Portugal - ao contrário da maioria dos outros países - a ir inteirinho para Governo e Operador(es). Não há partilha do Dividendo Digital com os cidadãos (leia-se, não há mais canais livres).

Este é o facto para o qual tenho chamado a atenção (tal como muitos outras pessoas, entre as quais os participantes deste excelente blog) e que só por si faz com que a TDT merece - digo mesmo merece o nosso boicote total aos canais pagos. É minha opinião que o progresso deve ser partilhado com os cidadãos e não servir para encher sempre os mesmos bolsos, coisa que neste país acontece com muita frequência devido à nossa passividade.

Quanto a questões técnicas... nada disto é surpresa para mim. O Mpeg-4 foi escolhido para poupar a PT a comprar novo equipamento (re-utiliza do MEO) e a frequência escolhida é meramente transitória. Não me admiro nada também que o DVB-T2 seja introduzido dentro de 2 ou 3 anos, acarretando nova mudança de receptor Tudo isto só é possível com uma premissa por parte da PT: o cidadão é acéfalo e vai a correr comprar o que quer que lhes vendamos através de (mais!) um sketch dos gatos...

Capitão Cosmos disse...

Muitas famílias humildes deste país vão ter, até 2011, que desembolsar 150 EUR (isto se não precisarem de uma antena nova...) para continuarem a ter imagem na sua televisão analógica.

Depois, mudança de frequências para poder libertar espectro para os videos youtube de "alta cólidade" no (novo) "telemóvel".
Quem tiver antena colectiva: mais gastos.

Um dia, mais tarde, nova transição por causa do DVB-T2, para poderem enfiar mais canais, mais compressão mais coisas que muita gente não pediu.

Viva a nova ordem mundial !

Helder disse...

Inflizmente tens toda a razão alias isto tudo começou com a escolha da norma que atirou para canto todos aqueles que já tinham lcd´s ou plasmas com tuner mpeg2 e continuou com a escolha da pt para a comercialização da pay tv atribuida a pt excluindo a arplus

Hélder disse...

"O Mpeg-4 foi escolhido para poupar a PT a comprar novo equipamento (re-utiliza do MEO)"

Errado. O MPEG4 foi escolhido porque é uma norma em tudo melhor que o MPEG2 e porque todos os países estão a começar a transição para MPEG4.

Os factos contradizem a sua afirmação: os canais TDT são bastante melhores do que aparecem no Meo.

Pathlost disse...

Helder, muito provavelemente - tal como no HISPASAT - a PT está a usar multiplexagem estatística. A multiplexagem estatística consegue maximizar o bit-rate de cada fonte ao transponder (largura de banda) disponível em função do número de canais que lá vão ser emitidos e das necessidades instantâneas de cada um. Não podemos comparar pela "qualidade". O que é isso qualidade? Mediste a constelação? O que observas não quer dizer que não estejam a usar as mesmas fontes de sinal - estão, e foi a própria PT a assumir isso no passado dia 29 de Abril.

Quanto ao MPEG-4 ser melhor que MPEG-2, pergunto eu em quê? Compressão, certo? De acordo, minimiza a largura de banda necessária para emitir com a mesma qualidade "perceptível". Mas quem for conhecedor da norma MPEG-2 sabe perfeitamente que o MPEG-2 tem perfis que permitem emitir com qualidade profissional e também HD. Por exemplo, os feeds profissionais da rede Eurovisão são em MPEG-2 4:2:2 por alguma razão...

Já agora uma dica: quem tiver aparelho próprio compare a luminância dos canais da TDT e compare com os actuais analógicos...

Yagi (autor do blog) disse...

"Os factos contradizem a sua afirmação: os canais TDT são bastante melhores do que aparecem no Meo."

Pois são, mas porquê? Porque na TDT estão a utilizar um bitrate muito superior! O Meo também utiliza o MPEG-4!

Mais importante do que a norma de compressão (mpeg-4 ou mpeg-2) é o bitrate utilizado e a qualidade técnica dos programas à entrada do multiplexer!

"O MPEG4 foi escolhido porque é uma norma em tudo melhor que o MPEG2..."

Errado! O mpeg-4 é superior, mas é baseado no mpeg-2. Tem apenas algumas "caracteristicas" suplementares relativamente ao mpeg-2.

A "vantagem" principal do mpeg-4 é ser mais eficiente a comprimir do que o mpeg-2 (à custa da necessidade de hardware mais potente e dispendioso na recepção). Mas, os multiplexers mais recentes são capazes de comprimir em mpeg-2 com bastante mais eficiência do que apenas alguns anos atrás.

Yagi (autor do blog) disse...

Eliseu,

Confirmo que a PT está a utilizar multiplexagem estatística na TDT, o que aliás está previsto na licença. A fonte do sinal dos 4 canais nacionais é a mesma, simplesmente são encaminhados para um multiplexer próprio.

Unknown disse...

e com o DVB-T2 que o reino-Unido está a planear para ser brevemente introdizido? como será feita a compressao?

Yagi (autor do blog) disse...

Gentil,

O DVB-T2 é um novo sistema de transmissão. A compressão tanto pode ser MPEG-4, MPEG-2 ou outra. Mas, certamente que será MPEG-4. São duas coisas distintas.

Em Portugal, as licenças que já estão atribuidas referem-se à utilização do sistema DVB-T, embora esteja acautelada a possibilidade de actualizações tecnológicas.