quinta-feira, 12 de abril de 2012

O Futuro da TDT em Portugal

O fim da televisão analógica em Portugal aproxima-se a passos largos. No próximo dia 26 será executada a 3ª e última fase dos “apagões”, com o desligamento dos restantes emissores e retransmissores do Continente, sendo alguns dos mais importantes da rede analógica, como é o caso da Lousã, Monte da Virgem e Montejunto. Como é sabido, o encerramento dos emissores e retransmissores analógicos vai libertar uma grande quantidade de espectro radioeléctrico (frequências). Essa libertação de espectro, devido à transição para o sistema de televisão digital (na Europa DVB-T), é chamada de dividendo digital. Em praticamente todos os países, esse dividendo é partilhado com os cidadãos através da oferta alargada de canais de televisão gratuitos, quase sempre liderada pelo serviço público de televisão. Isso nos outros países, porque em Portugal parece existir um pacto entre a PT, o Governo (actual e anterior) e as televisões para que tudo fique como antes da chegada da TDT. Em Portugal, as famílias foram obrigadas a incorrer em gastos, que nalguns casos ascendem a várias centenas de euros, simplesmente para não ficarem sem o acesso aos quatro canais de sempre!

Com venho afirmando, em Portugal, a introdução da Televisão Digital Terrestre foi sabotada em benefício da televisão por subscrição e o resultado está á vista. Antes do inicio da migração mais de 50% das famílias só recebia a televisão dita gratuita (RTP, SIC e TVI), agora esse valor baixou para apenas 30%. E os políticos que nada fizeram em benefício da TDT, referem agora de forma cínica (*) a baixa quota da TDT como justificação para não se apostar na TDT! Enquanto a Televisão Digital Terrestre é um sucesso em praticamente todos os países, inclusivamente onde há também importantes operadores de televisão paga, em Portugal é um fracasso porque tudo foi feito para que fosse um fracasso!

A PT desistiu de lançar a sua oferta de TDT paga e os cinco Muxes associados foram pura e simplesmente abandonados. Ficou a ideia de que “se não são para a PT, não são para mais ninguém”. Como tenho afirmado repetidamente, e já foi reconhecido, o Mux A (o único utilizado) tem espaço para mais canais, pois desde o lançamento da TDT cerca de 30% do espectro não é utilizado e nem o 5º Canal nem o Canal HD algum dia verão a luz do dia. No entanto, tanto o governo actual como o governo anterior recusaram-se a fazer a RTP aplicar os planos que tinha para a TDT, com a introdução de novos canais temáticos. E com a desculpa da contenção de custos continua a descarada protecção ao lobby PayTV, por parte de alguns políticos que não hesitam em usar a mais barata demagogia para iludir os portugueses e passar por cima do interesse público.

Com estes actores e com este Status Quo, que futuro podemos esperar para a Televisão Digital Terrestre em Portugal?

Lamento desapontar os mais optimistas mas, baseado no que já apontei, a TDT não tem futuro em Portugal. Não com estes políticos. Não com esta administração da RTP. Não com este regulador. Como já disse, as promessas da ANACOM relativamente à possibilidade de novos canais após o Switch-off não passarão disso: promessas. O lobby da PayTV tudo fará para que nada seja concretizado. O futuro da Televisão Digital Terrestre ficou selado quando a PT desistiu de lançar o MEO DT (para a alegria de alguns) e não foi dada utilização alternativa aos Muxes B-F. Como já afirmei, dada a cronologia dos acontecimentos, faz todo o sentido concluir que a PT concorreu à TDT apenas para impedir a entrada de um 3º player de peso no mercado da PayTV. Política de terra queimada, portanto…

A PT continua a ser a única entidade autorizada a emitir televisão em Portugal, situação que se prevê irá continuar e que constitui um travão ao surgimento de novos canais de âmbito nacional, regional ou local na TDT. Porque continuam a não ser permitidas televisões regionais e locais? Porque não se concedem licenças às universidades para emissões locais de DVB-T como aconteceu com a rádio? De que têm medo os políticos?

Mas, com uma quota de mercado de apenas 30%, resultado da referida sabotagem, o investimento na TDT dificilmente será economicamente viável. E relativamente á televisão regional, a questão é ainda mais complicada pois, uma vez que no Continente se optou por utilizar exclusivamente uma rede de frequência única, um canal regional para garantir a cobertura razoável do seu público-alvo teria que utilizar também rede de frequência única e os mesmos sites do Mux A na região em causa, pois caso contrário obrigaria muitas famílias à utilização de uma 2ª antena receptora, o que seria um obstáculo importante à cobertura.

Embora relativamente ao DVB-T estejam planeadas, para após o Switch-off, três redes MFN de cobertura nacional em UHF, uma rede MFN de cobertura Distrital em UHF e uma rede SFN de cobertura nacional em VHF, o mas provável é que nada seja posto em prática. Idem para os três muxes MFN de cobertura nacional para o DVB-H.

Teremos pois dentro de dias o lançamento do Canal Parlamento (ARTV) na TDT. Um canal que é serviço público, mas de pouco ou nenhum interesse para a maioria dos portugueses, como ficou evidente na votação dos leitores do blogue TDT em Portugal. A emissão do canal terá um “preço de amigo” por parte da PT. Não surpreende, julgo que a PT deverá mesmo estar grata a alguns políticos “amigos” que tão bem têm “olhado” pelos seus interesses. Enquanto isso, canais "interessantes" e classificados de interesse público como a RTP Memória e a RTP Informação, cuja presença na TDT já foi reclamada pelos portugueses, inclusivamente através de Petição, continuam um exclusivo das plataformas de televisão por assinatura e assim continuarão, pois “outros interesses” se sobrepõem.

Após 26 de Abril termina também o período de simulcast e consequentemente termina também a obrigação de reserva de capacidade de espectro para a emissão do Canal HD por parte da PTC. O espectro ficará então "livre" para a PT, se assim decidir e após autorização, o utilizar, por exemplo, para lançar um canal destinado a promover o MEO! Já nada me surpreende…

Vem-me á memória uma frase batida, aqui no blogue TDT em Portugal: com a TDT muda alguma coisa para que tudo fique na mesma!

* Assista-se por exemplo à audição do ministro Miguel Relvas em 3/04/2012.

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16 comentários:

Miguel disse...

Dizes que "Em Portugal, as famílias foram obrigadas a incorrer em gastos, que nalguns casos ascendem a várias centenas de euros (...)" como se nos outros países a TDT fosse completamente de borla...

Anónimo disse...

Não é verdade que a percentagem que apenas vê os 4 canais seja de apenas 30%. Isso é a mentira que a Anacom tem dito, a penetração da TV paga não é de 70%!!

Na realidade, dados oficiais da própria Anacom mostram que a penetração do serviço de TV por subscrição ainda está bem abaixo dos 55%.

Ou seja, ainda temos perto de metade da população a ver exclusivamente os 4 canais de sinal aberto.

Anónimo disse...

Muitos destes governantes actuais só são actores para as câmaras de televisão... porque fazer alguma coisa não é para eles.
O ministro relvas continua a afirmar que o canal parlamento é que vai "dar um grande impulso à TDT"... ora, como já li por aí num comentário, em vários operadores de cabo esse canal "tão interessante" está colocado muito perto dos canais de tv shopping. Tal é o interesse dele...
Mas, vamos esperar.
Aquando da entrega por meia dúzia de euros da licença da RTP1 e da venda do património por mais uns euritos, eles vão ter de revelar quanto é que recebem dos operadores de cabo e como é que vão aguentar os custos do canal 2 (e, possivelmente, dos outros canais que fiquem na RTP).
Com a grande ajuda da nova empresa que está a medir as audiências, sabemos agora que a RTP perde no primetime para vários canais de cabo.
Em território nacional os noticiários tem mais audiência na RTP Africa que na RTP1. Como todos temos acesso à RTP Africa devem ter alguma razão...
Graças a estes valores, a licença da RTP poderá ser doada a alguém que a queira usar...
E a TDT continuará a ter 4 canais... com o canal de promoção dos parlamentares a ser o tal "que vai mudar o interesse".

Yagi (autor do blog) disse...

Nos outros países a TDT também não é de borla, mas nos outros países a oferta de canais aumentou, precisamente para compensar os cidadãos pelos custos inerentes à migração, como argumento no post.

E o custo da migração é comparativamente mais alto em Portugal pelo simples facto do nível de vida dos portugueses ser MUITO inferior ao da maioria dos outros países (a não ser que nos queiramos comparar com países do terceiro mundo).

Anónimo disse...

Desde 1988 que acompanho os canais de Espanha (vivo no Baixo Alentejo). Assisti ao início dos privados: Antena 3, Canal Plus e Telecinco, ao início do Canal Sur 1 e depois do Canal 2 Andalucia . Há poucos anos à passagem do Canal plus para o canal Cuatro. Ao aparecimento de La Sexta. E por fim da TDT Espanhola.
Sei, pelo que lia e via, que houve sempre apoio e legislação quer do Governo, quer das regiões autónomas, para a criação de canais de TV de acesso gratuito e pago. O Canal plus, ideia vinda de França, era codificado e pago e quando passou para o satélite abriu mais canais pagos. No entanto ao contrário de Portugal a televisão por cabo nunca vingou em Espanha. Os canais públicos nacionais (tve 1, tve 2) e os autonómicos tiveram e continuam a ter apoio dos respectivos Governos. Os privados: telecinco de inicio apoiada pela sua irmã italiana, o canal plus pelo seu gemeo francês, e a antena 3 tv não sei por qual empresa, continuaram em sinal aberto. Quando foi lançado o satélite Hispasat alguns canais passaram também a emitir via satélite uns em pacotes outros livremente. Mas eis que surge a TDT Espanhola e regressam todos ou quase todos à Terra e cada dia ou cada mês nasce um canal novo quer descendente dos canais mãe: tve, antena 3, telecinco + cuatro, la sexta ou de outras empresas. Concluindo: do terrestre analógico, passaram para o satélite, o cabo não vingou, e voltaram ao terrestre digital.

Em Portugal, e lido o artigo acima, em que estou de acordo em quase tudo, só vejo uma explicação: a falta de mais canais além dos 4, o recurso a parabólicas mas com insatisfação por serem canais estrangeiros, a pressão da publicidade (como foi a dos telemóveis) o marketing telefónico, ou feito porta a porta, convenceu muita gente a pagar para ter mais canais falados ou legendados em português. Isto deu-se principalmente com as pessoas do litoral que não tinham acesso ao sinal vindo de Espanha.
A pressão é tanta que, enquanto em Espanha discutia-se como receber a TDT pela antena terrestre do condomínio, em Portugal quase ninguém que viva num prédio ou apartamento escapa à assinatura da tv por cabo, mesmo aquelas pessoas que recebem o rendimento social de inserção ou que estão desempregadas, pois duvido que haja uma antena terrestre para o condomínio em muitos prédios ou andares hoje em dia.
O que vejo no futuro é, e talvez me engane, semelhante aos EUA: canais em sinal aberto apenas os nacionais públicos (ou o único nacional), alguns regionais ou locais e da sociedade civil, enquanto os privados vão todos para o cabo, para a net ou para o telemóvel

Jose Luis disse...

Yagi, pra que é essa rede SFN em VHF?

A banda VHF não fora destinada à radio digital?

Yagi (autor do blog) disse...

Nos EUA a Televisão Digital Terrestre oferece DEZENAS de canais gratuitos (FTA), públicos e privados! A titulo de exemplo, em Nova Yorque recebe-se mais de 50 canais gratuitos, muitos em HD! E o mesmo acontece um pouco por todos os EUA.

Como afirmo no post, muitos outros paises têm ofertas fortes de televisão paga e a TDT é também um caso de sucesso. França, Italia, Reino Unido e também Espanha e muitos outros. A grande diferença é que em Portugal há um proteccionismo descarado e vergonhoso à PayTV. Esse proteccionismo soa bem alto nas palavras de "alguns" políticos e pseudo-especialistas que estão na realidade ao serviço do lobby televisão paga. Chegam ao ponto de pretender desacreditar a TDT como plataforma e negar o sucesso que a mesma obteve em tantos outros países. Não fosse esse proteccionismo descarado à televisão paga e também teriamos uma TDT decente. Assim, os cidadãos/consumidores são lesados e continuam a alimentar empresas que são "levadas ao colo".

Yagi (autor do blog) disse...

A rede SFN em VHF (C5) seria para possibilitar a recepção da TDT em movimento (nos automóveis). Em UHF também é possível mas utilizando a banda VHF técnicamente é melhor. Como digo no post esses planos (trata-se apenas do planeamento de frequências), muito provavelmente, não sairão do papel.

Nuno disse...

Eu resumia o futuro da TDT de uma forma muito simples:
É algo sem futuro

No ponto em que estamos, com a vontade que há e sem mais meios de pressão para que surjam alterações, a TDT portuguesa não se irá alterar, se algo que actualmente se pode considerar "dificilmente tem presente" (comparando com outros modelos), como podemos esperar que venha a ter um futuro?

Anónimo disse...

Bem vejamos as coisas por este prisma, imaginemos que todos os portugueses cortam o seu serviço paytv, alteram para o TDT? será que aí o descontentamento da populaçao iria ser maior? seria mais notória esta insatisfaçao?
Vejamos também, a população portuguesa tem paytv porque a oferta portuguesa de canais é uma porcaria, não presta, era de facto necessario uma outra oferta televisiva com mais variedade e menos "burrice" espalhada por estes canais ou por pessoas a gritar. a TDT é uma banhada nisto tudo, e em vez que de utilizar o restante espaço que deixa o sinal analógico ao ser desligado para promover mais canais, não, vão utilizá-lo para a tecnologia 4G (conforme noticiado).
Em Portugal só mexem empresas privadas e com o objetivo de terem lucro, e só prova que devemos seguir o conselho do sr 1º ministro- emigrar que isto não está nem para os frangos.

jose luis disse...

Segundo o semanario SOL a TVI vai ter 2 novos canis na oferta paga um na ZON denominado + TVI, outro no MEO, TVI ficção; por isso que estes senhores tambem não faziam campanha para a TDT.Eles lá tinham as suas razões! Não puseram eles o TVI 24 na TDT.Eu vou vendo RTP2 e espanhois não estou pra alimentar chulos!

Yagi (autor do blog) disse...

A TDT portuguesa está viciada desde a primeira hora. As televisões, a PT e o próprio Governo estão apostados no fracasso da TDT, como está mais que provado!

Miguel disse...

Antes o canal do Parlamento do que mais canais da TVI! Livra!

songohan disse...

http://www.publico.pt/Media/canal-parlamento-precisa-de-licenca-para-emitir-sinal-em-aberto-1559605

Já li para aqui isto, não sei se foi o Yagi a falar da situação... e a ERC já a confirmou.
Para o canal parlamento entrar para a TDT terá de existir uma alteração à lei da televisão ou ser aberto um concurso público para o 5 canal em sinal livre ser emitido.
(se não foste tu a falar disto, peço desculpa... mas já li algures um comentário que falava disto há um bom tempo atrás)

Santos disse...

Yagi, tiveste conhecimento disto http://www.anacom.pt/render.jsp?contentId=1150265 ?

Yagi (autor do blog) disse...

Tive conhecimento, divulguei e enviei o meu contributo. A consulta só terminou à meia noite do dia 1 de Fevereiro. Como não tenho por hábito divulgar documentos antes do destinatário ter possibilidade de os consultar (não sei se a ANACOM lê assim que recebe ou só depois de encerrada a consulta), só oportunamente divulgarei o contributo enviado pelo blogue TDT em Portugal.