É já sabido que após o chamado desligamento analógico, que em Portugal se prevê ocorra em Abril de 2012, uma larga faixa do espectro radioeléctrico será "libertado" ou "desocupado". A essa "libertação" de espectro dá-se o nome de Dividendo Digital.
Precisamente, uma das principais vantagens dos sistemas de difusão digital prende-se com a economia de espectro, ou seja, necessitam de ocupar um espaço (frequências) muito menor para difundir os programas. Com a substituição da difusão analógica pela digital (DVB-T, ATSC, etc), a maioria das frequências utilizadas para a difusão dos actuais canais de televisão ficará disponível.
A Comissão Europeia tenta implementar uma harmonização entre os estados membros relativamente a esta questão. Á semelhança de outros países, também em Portugal (através da ANACOM), se discutiu a utilização a dar ao espectro a libertar em 2012. Apesar de não divulgar publicamente o relatório da consulta pública que decorreu para o efeito, a ANACOM transmitiu num
texto publicado as suas conclusões a propósito do mesmo.
Tal como se esperava, o que mereceu mais interesse (ou “apetite”) por parte dos interessados (presumivelmente operadores móveis), foi a atribuição da faixa de frequências 790-862Mhz para comunicações móveis de banda larga. Recorde-se que esta faixa é actualmente utilizada na difusão da TDT. Por motivos técnicos e económicos, os operadores de serviços móveis têm feito fortes pressões para lhes ser atribuída essa faixa de frequências a fim de expandirem as suas redes. Alguns países (Espanha é um deles), já decidiram nesse sentido. Em simultâneo, a ANACOM consultou a GSMA sobre esta matéria que, como é óbvio, defende a atribuição dessa faixa de frequências aos operadores móveis.
O seguinte parágrafo do texto da ANACOM merece alguma reflexão:
«Realça-se também que se perspectiva que mais países europeus venham a tomar decisão idêntica, reforçando cada vez mais uma harmonização de facto a nível europeu quanto a esta sub-faixa, pelo que se começa a desenhar uma tendência generalizada da sua atribuição para aplicações móveis de banda larga – agora também em Espanha – facto que deverá ser particularmente ponderado numa decisão final sobre esta matéria, nomeadamente quanto aos elevados riscos de isolamento que Portugal pode correr neste domínio.»
Quando foi seleccionada a norma MPEG-4 não terão sido ignorados os riscos de isolamento relativamente a Espanha, que adoptou o MPEG-2!?
Como é óbvio, esta decisão não é pacífica! A encabeçar o grupo dos “descontentes” estão os grupos operadores de televisão que argumentam que irão ter custos acrescidos, pois serão obrigados a mais um processo de transição. Em Portugal, como os operadores de televisão não têm rede própria (a difusão do sinal de televisão está a cargo da PT) esta questão não se deverá colocar. Não esqueçamos que a PT pretende antecipar o desligamento do sinal analógico em um ano, para 2011. Certamente que a PT irá concorrer (e provavelmente ganhar) o(s) concurso(s) que se avizinham. No entanto, a maioria dos telespectadores que recebam a TDT através de sistemas colectivos terão que realizar novas alterações nos sistemas de recepção! Os restantes espectadores apenas terão que re-sintonizar os seus receptores.
Para além da sub-faixa 790-862Mhz, que deverá ser destinada a comunicações móveis de banda larga, grande parte do espectro entre 470Mhz e 790Mhz ficará livre. Uma parte será destinada à televisão digital móvel e à alta definição. Infelizmente, relativamente à televisão regional e local mantém-se a indecisão. Nesta faixa (banda IV e V), para além das actuais frequências cujas licenças já foram atribuídas, a ANACOM planeou 3 coberturas MFN de âmbito nacional, 1 cobertura MFN de âmbito distrital e 3 coberturas MFN de âmbito nacional destinadas ao DVB-H.
Sendo o espectro radioeléctrico um bem público com o potencial de gerar enormes receitas para os detentores das licenças de exploração, esperemos que o Estado saiba obter as justas contrapartidas financeiras. Recorde-se que a optimização do espectro conseguida em parte devido à adopção da norma MPEG-4 (versus MPEG-2) tem, até à data, beneficiado apenas o operador da rede e os canais de televisão que pagam uma taxa de utilização mais baixa. O telespectador, esse foi “contemplado” com uma factura mais alta para pagar pois, como é sabido, os equipamentos compatíveis com a TDT portuguesa são (muito) mais caros.
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